Jogar ou fazer jogos? Eis a Questão!

Jogos são peças complexas de software que demandam uma quantidade inimaginável de tempo e esforço de uma equipe dedicada ao sucesso deste. E por mais duro que seja, as habilidades de quem joga e de quem faz jogos não são as mesmas, mesmo que quanto mais jogos você conhecer, maior será sua experiência na hora de criar seu pequeno pedaço de universo virtual.

Primeiramente o óbvio. Quando você começar a criar seu jogo, se você for pago para isso será seu trabalho. Então você terá que, por regra, ficar olhando para esse jogo oito horas por dia, cinco dias por semana, durante um tempo de produção que pode variar entre vários meses a alguns anos. Vai chegar um dia em que olhará para esse jogo e falará "Não quero mais ver isso na minha frente" e isso indicará que fazer jogos talvez tenha deixado de ser divertido. Uma boa maneira de saber se é um problema com o desenvolvimento em geral ou apenas desgaste com o projeto atual é tentar atuar em outro projeto independente. Se você conseguir aturar fazer outro projeto então você só está um pouco cansado do projeto em que está trabalhando e vai superar isso quando começar alguma coisa nova.

Fazer jogos também envolve trabalho em equipe. A não ser que seu projeto seja pouco ambicioso, você tenha tempo de sobra e domine cada área necessária para se criar um jogo, você vai precisar de ajudar para concluir o projeto antes de desistir ou enlouquecer. Tente encontrar pessoas dispostas e confiáveis para começar a criar os mundos que deseja. E se elas estão trabalhando sem serem diretamente pagos por você, então elas tem tanto direito a tomar decisões no projeto quanto a parcela do trabalho que elas realizaram.

Se você não é pago para criar o jogo, então você tem mais controle sobre onde e como você quer trabalhar. Mas para que o projeto passe a ser algo tangível é necessária muita dedicação. Um projeto independente completo, mesmo que de pequeno porte, pode levar muito tempo. A primeira versão do BoxBall na qual trabalhei foi feita em um mês onde devo ter utilizado mais de 300 horas do meu tempo dedicado ao projeto. Horas nas quais deixei de jogar e com perspectivas mínimas de qualquer ganho financeiro. Mas garanto que para mim valeu cada segundo e me diverti tanto ou até mais fazendo o jogo que jogando um jogo de sucesso.

Depois disso, até as coisas se acertarem, o novo rumo do projeto ser decidido,e parcialmente implementado, já se passaram dezoito meses. Obviamente cada membro do projeto não está dedicando todo o tempo para criar o jogo, e existiram vários atrasos. Mas é importante entender que esse tipo de coisa pode acontecer em qualquer projeto. Mas nenhum de nós abandonou seu posto e pulou na água e nenhum de nós ganha a vida fazendo jogos. Fazemos porque gostamos e estamos orgulhosos do que fizemos. E acho que falo por todos quando digo que não pretendo parar com o BoxBall.

Então se você quer fazer jogos esqueça a parte de que você vai jogar o dia todo. Jogar e fazer jogos são atividades diferentes que envolvem o mesmo produto. Como as duas faces da mesma moeda. Antes de você começar a criar jogos como um designer de mecânicas é altamente recomendado você ter jogado bastante tempo. Mas o tempo que você gastar fazendo seu jogo não será gasto jogando. Então entenda a diferença e tome a decisão: Jogar ou fazer jogos?

P.S.: A pergunta não foi retórica: responda nos comentários. Vamos construir uma discussão saudável.

A Escolha da Língua

Se você pensa em desenvolver jogos você tem que pensar em como se comunicará com seu jogador. A não ser que você recorra a algum método revolucionário para fazê-lo, você não terá escolha a não ser usar alguma língua compartilhada por alguns milhões de humanos. E se você está lendo isso provavelmente sabe se comunicar utilizando a língua portuguesa. Mas nos jogos o idioma é metade da restrição do público que jogará seu pequeno, ou não tão pequeno assim, projeto. A outra metade é basicamente todo o resto das decisões que tornarão seu jogo bom ou ruim para os diversos públicos já existentes ou tentará explorar um público completamente novo.

A questão da língua é basicamente a seguinte: se você pode investir o tempo e o dinheiro, por regra, vale a pena fazer seu jogo no maior número de idiomas possíveis. Porque você tem mais público para quem vender. Mas se você consultar a tabela de línguas mais faladas chega um ponto que se torna inviável ter retorno pelo investimento em traduzir para algumas formas de comunicação humana pouco utilizadas. Então está ai um primeiro parâmetro: Ver até onde vale a pena ter trabalho para obter retorno. Alias isso é o principal ponto para decidir recursos secundários que seu jogo terá.

O segundo ponto é levar em conta é que seu jogo provavelmente é uma publicação para um pequeno nicho de jogadores "hardcores", que já dominam pelo menos o inglês exatamente por jogarem jogos em inglês. Então inglês é basicamente obrigatório para que seu jogo tenha um público bem amplo. Porque mesmo quem não é falante nativo de inglês está minimamente familiarizado com ela, e consegue entender. Mas vale lembrar que a versão em inglês será a principal face do seu jogo para o público. Então esta precisa estar muito bem feita.

Mas o ponto realmente importante deste pequeno devaneio é ajudar na decisão dos desenvolvedores brasileiros de ter uma versão em português de seu jogo. Se você pretende divulgar pesadamente no âmbito nacional, e quando digo pesadamente quero dizer gastar dinheiro de verdade com publicidade. E se conheço bem os meus leitores (constituídos basicamente da, literalmente, meia dúzia arrastada pelo Twitter) sei que vocês não tem dinheiro para investir em publicidade. Então não vale a pena pensar em preparar todo um sistema para o jogo ter suporte a múltiplas línguas, mesmo estas sendo o inglês e sua língua nativa.

Falando no sistema para suportar multiplas linguagens. Quando se cria tal suporte é necessário testar todo o texto e audio de todas as versões. E isso é um custo de tempo impraticável para pequenos desenvolvedores. Sem falar em preparar todo o sistema de menus e caixas de texto e legendas para suportar o dinamismo que vários idiomas diferentes tem.

Sendo assim acredito que para o pequeno desenvolvedor não vale muito a pena investir na localização para mais de um idioma, mesmo que seja nossa língua mãe. Mas caso você acredite que pode trazer uma experiência única em outra língua vá em frente. Eu te desafio!

Referências e Ponteiros

Recentemente vocês devem ter notado um aumento no nível de reflexão sobre alguns jogos, principalmente no post da semana passada sobre os jogos da Rockstar. Isso é parte de um projeto pessoal de tentar aprimorar minha visão sobre os diversos jogos. Aqui vou citar três referências fortes para essa mudança de foco nas análises e para tentar obter mais conhecimento para criar jogos melhores.

Games:
A primeira referência, obviamente, são jogos. Mas não apenas os jogos bem falados e amplamente conhecidos. É dever de alguém que quer melhorar como designer de jogos procurar saber cada vez mais sobre todo tipo de jogo, seja ele um grande lançamento ou um título independente, sempre jogando ao menos um pouco o título e descobrindo o que torna aquele título bom ou ruim e o porque  de tal resultado. Afinal recursos desconexos podem comprometer a qualidade do que você está fazendo.

Um exemplo da aplicação dessa experiência com jogos foi no BoxBall, que será lançado um dia e devidamente divulgado por aqui. A mecânica de Power-Ups fica interessante a partir do momento que toda a representação gráfica reforça um funcionamento plausível daquela mecânica. O Pong original, alem de todas as limitações técnicas para executar os Power-Ups, não tem uma representação gráfica que valorize o funcionamento desse recurso. Agora sendo muito sincero: com certeza quando o estilo de arte foi decidido com certeza não foi feito com esse foco especificamente. A idéia no momento da criação era muito mais abstrata e surgiu a quase dois anos. Desde então tudo evoluiu muito. Mas a análise descrita acima é valida e crucial para aprimorar os próprios processos criativos e produtivos.

Gamasutra
Outra fonte incrível de conhecimento mais técnico sobre jogos eletrônicos é o site Gamasutra (http://www.gamasutra.com). Lá você encontrará dezenas de artigos e entrevistas com vários nomes conhecidos, ou pelo menos nomes que ajudaram em trabalhos fantásticos e bem conceituados. E textos sobre todos os aspectos do desenvolvimento, desde design até tradução dos jogos. Tudo que você precisa é ser capaz de entender textos em inglês, ter interesse e escolher a área do desenvolvimento que mais lhe interessa para começar a aprender.

The Escapist: Extra Credits
The Escapist é um site de notícias diversas sobre jogos eletrônicos. Entretanto o grande diferencial deles são várias séries de com os temas mais variados. Mas o grande ouro está na série Extra Credits (http://www.escapistmagazine.com/videos/view/extra-credits?page=1). Escrita por James Portnow, a série traz um ponto de vista muito interessante, profundo, e revolucionário em seus vídeos sobre vários aspectos deficientes nos designs modernos dos jogos.  Um bom exemplo é a falta de personagens femininos ricos psicologicamente. Vale a pena assistir todos os vídeos para aprender e ter um ponto de vista muito sensato sobre diversos assuntos envolvidos no design. O único problema é ter que entender o inglês falado, que pretendo resolver trazendo um ponto de vista tão sensato quanto o deles nos textos que seguirão este. Obviamente não vou ficar traduzindo os textos deles porque um dos pontos que defendo é a criatividade e novas abordagens. Mas de qualquer forma fica uma pequena recomendação.

E é claro que experiências pessoais ajudam a moldar e encarar experiências nos jogos. Mas ficam ai dicas mais concretas e simples para aprender e ver com outros olhos as várias facetas do desenvolvimento dos jogos.

Discutindo os games da Rockstar

Com exessão de um simulador de ténis de mesa, todos os jogos da Rockstar são considerados o ápice da violência no meio. As três séries com maior repercussão foram Bully, GTA (Grand Theft Auto) e Manhunt. Aqui eu vou falar um pouco da contribuição que ela fez para a industria com esses títulos.

Como todos devem saber, os três jogos citados são considerados extremamente violentos, já que o jogador pode agredir ou matar a vontade, incluindo pessoas que não agrediram o personagem em momento algum. E nenhum destes três jogos é considerado uma obra que deve ser consumida por crianças. Levando isso em consideração vamos tratar essas obras de forma adulta. Nada impede de tratar as três obras como críticas a aspectos violentos da sociedade, onde criminosos matam pessoas que estão passando na rua e crianças agridem e humilham umas as outras.

Em Manhunt você é colocado no papel de um assassino que foi libertado para matar pelo bel prazer dos benfeitores dele. Agora, se você pensar que o jogador, por estar assistindo as agressões do protagonista, é um desses benfeitores, contribuindo para que o protagonista fique livre nas ruas matando de formas horrendas para agradar seu público. A motivação do libertador do protagonista de Manhunt é divertir um público interessado em ver mortes sanguinárias. E o jogador é parte desse público e o fornecedor da diversão. Depende apenas do ponto de vista que o jogador está presenciando. Isso é reforçado pelas mudanças dos ângulos da câmera. Quando você está movimentando o personagem ela assume o ângulo clássico de jogos em terceira pessoa, mostrando as costas do personagem. Durante as execuções a câmera muda para proporcionar uma visão privilegiada do assassinato.

O BOPE criou o saco. Mas o Manhunt não o discrimina
Bully trata da violência nas escolas. Violência que eu presenciei e tenho certeza que muitos presenciaram em suas vidas escolares. Mas por que o jogo é criticado por ser violento sendo que isso acontece em todas as escolas do pais todos os dias letivos? Porque ele expõe essa violência para pessoas que acham que o mundo é lindo, que não existem problemas e que gostam de ficar em casa sem fazer nada para melhorar a sociedade. Quando você mostra o problema, ou força a pessoa a participar de alguma forma para que ela reflita sobre a realidade ela se assusta. Então ela se defende afirmando que a violência é sem sentido e pode influenciar as crianças. O grande detalhe sobre Bully é que o jogo é protagonizado por adolescentes, retratando uma realidade cotidiana para esses estudantes que sofrem ou praticam bully. Eu posso falar porque eu me formei no Ensino Médio no final de 2005, e o jogo foi lançado em 2006. Então minha geração não foi exposta ao jogo antes de praticar bullying.

As aulas de luta Greco-Romana são as horas mais pacatas na Academia Bullworth
E então chegamos ao GTA. A franquia mais conhecida da Rockstar. GTA IV foi um dos jogos mais caros a ser produzido na história, e ele por si só não foi muito criticado. Mas no início a franquia foi polemizada pela possibilidade de matar pedestres ou qualquer pessoa. Mas quem assiste noticiários por cinco minutos sabe que os criminosos farão o necessário para obter o quê eles querem. Seja dinheiro, respeito, reputação. Inclusive matar pessoas. E duas faces importantíssimas dos personagens do GTA, principalmente os mais elaborados a partir de GTA III, é que eles não se envolvem com tráfico de drogas e que todos tem missões pessoais que para eles justificam as ações violentas. Nico Bellic, protagonista de GTA IV, está tentando recomeçar a vida após lutar na guerra de seu pais e sacanear alguém poderoso demais no emprego anterior. Ele volta a cometer crimes para salvar a pele do primo, que mentiu sobre toda a situação financeira. A maioria das pessoas não sairia matando por causa disso, mas isso traz uma nova dimensão para os personagens. Eles não são simplesmente malignos, esses protagonistas tem motivações, algumas vezes família, outras vezes vingança, mas nenhum é uma maquina completamente vazia de matar. Não estou dizendo que isso justifica as ações deles, mas se você ver como uma crítica a como as pessoas reagem quando são pressionadas ou quando algo que elas valorizam é ameaçado é bem válido o ponto de vista.

Nada como um calmo passeio pelas ruas de Liberty City.

Finalmente acredito que a Rockstar, mesmo que inconscientemente, trouxe um ponto de vista diferente do usual para a violência. Ela ao invés de se esconder por traz de temas leves e descontraídos aos seus jogos tenta trazer parte da violência que pessoas vivem todos os dias para que as pessoas vejam e de certa forma entendam o quê acontece nessas vidas. Esse tipo de análise é essencial para promover os games como forma de aprimoramento filosófico do ser humano, da mesma forma que filmes, pinturas e musica fazem, em alguns casos, a milhares de anos.
 
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